sexta-feira, 29 de março de 2013

Morcegos de partida

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Passava dias e noites a escrever para os belos malmequeres do jardim. Pouco falava e, quando lhe imploravam que o fizesse, cantava. Tocava violino por entre marés da dor de quem procura uma alma longínqua nos dias mais lúgubres como eram aqueles pelos quais passava. Quando compunha melodias de angústia e cansaço quase que sentia borboletas sobrevoarem-lhe a cabeça. Já não mais gostava de falar, só o fazia com os melros que passavam tardes a passear e, por conseguinte, a pipilar pelo seu jardim fora. Cor de ouro, dizia quando lhe perguntavam qual a cor dos seus cabelos. Adorava o mar e dizia-se pelas ruas da cidade que quando admiravam minuciosamente os seus olhos era possível senti-lo. 
A tia havia partido há meses e ela sentia morcegos pousarem-se-lhe no pescoço desde a noite em que ela partira. Dormia amedrontada e chorava rios de saudade quando nela pensava. Voavam-lhe os cabelos, era despida pela Lua e deixava a alma cair sempre que em memórias de outrora se deixava tropeçar. E os céus choravam com ela, enquanto a vislumbravam  dolorosamente perder-se de si.

4 comentários:

  1. magnifico.. é como o assistir de um dia: primeiro azul rasgado de tons de ouro, para no final ganhar hematomas sob o peso da vida, e se apagar em azul petróleo. oh

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  2. É óptimo saber que alguém partilha dos mesmos sonhos que nós :)

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